domingo, 15 de fevereiro de 2009



Registro reflexivo


Há uma frase do Eduardo Galeano de que gosto muito: “somos o que fazemos, mas principalmente o que fazemos para mudar o que somos”. Creio que nesses dias de formação eu estava mais uma vez tentando melhorar o que já sou. Sei que o conhecimento não vai apenas aperfeiçoar minha vida profissional, pois sou daqueles que acreditam que o conhecimento é uma forma de nos melhorar como pessoa.
Tivemos uma semana muito produtiva, tive a sorte de ficar numa sala de profissionais competentes, criativos e divertidos (aprendi muito com eles!!!), sem contar com a nossa formadora (pró Isabel) dispensa comentários pela humildade com que se relacionou conosco, pela maneira que propôs as atividades e encaminhou as discussões. Não tem preço o valor daqueles momentos de reflexão, momentos de troca de experiência, nisso ver e conhecer a realidade e a luta de meus colegas tão semelhante à minha. É fundamental a oferta do entendimento individual para a construção do acervo coletivo. Como bem falou Paulo Freire, o registro da reflexão e sua socialização num grupo são fundadores da consciência e são também instrumentos para a construção do conhecimento. As trocas e reflexões constantes que nortearam os nossos encontros naquela semana certamente vão nos impulsionar para uma ação transformadora e se conseguirmos agir da mesma forma com os nossos cursistas, promoveremos mudanças e melhorias nas suas práticas pedagógicas.
As palavras mudança e melhoria me fizeram lembrar de um dos melhores dias da semana de formação, no dia em que estudamos o TP3. Certamente todos os professores que participam da formação já haviam estudado em muitos outros momentos os gêneros textuais, mas naquele dia teve um gostinho diferente; foi muito construtivo poder trabalhar esse conteúdo com os colegas, realizar a atividade do envelope da linguagem...E mais construtivo ainda refletir sobre o ensino dos gêneros textuais e os mitos ligados a esse ensino,pois muitas vezes em vez das práticas estamos ensinando objetos partindo da lógica de que se meu aluno sabe o que é um gênero então sabe escrevê-lo,aplicando a mesma idéia de nomenclatura que fazemos quando ensinamos gramática. Deve-se aprender pelas práticas e não pelos objetos,foi essa a consciência fortalecida nesse encontro. Os gêneros discursivos são gerados nas atividades humanas, quanto maior o número de atividades humanas maior o número de produção textual. Os textos devem ser trabalhados a partir de seu valor sócio-comunicativo e dentro de uma situação real de comunicação.
Além desse dia podemos dizer que todos os outros foram dias em que prática, teoria e consciência foram “gestadas” .ficando em mim uma ótima sensação de insatisfação , isso me tira da zona de conformismo e me leva para uma busca de desafios. O resultado será estudo e conseqüentemente mudança de atitude.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

A palavra

Tanto que tenho falado, tanto que tenho escrito
como não imaginar que, sem querer, feri alguém?
Às vezes sinto, numa pessoa que acabo de conhecer,
uma hostilidade surda, ou uma reticência de mágoas.
Imprudente ofício é este, de viver em voz alta.
Às vezes, também a gente tem o consolo de saber
que alguma coisa que se disse por acaso
ajudou alguém a se reconciliar consigo mesmo
ou com a sua vida de cada dia;
a sonhar um pouco,
a sentir uma vontade de fazer alguma coisa boa.
Agora sei que outro dia eu disse uma palavra que fez bem a alguém.
Nunca saberei que palavra foi;
deve ter sido alguma frase espontânea e distraída que eu disse
porque senti no momento e depois esqueci.
Tenho uma amiga que certa vez ganhou um canário
e o canário não cantava.
Deram-lhe receitas para fazer o canário cantar;
que falasse com ele; cantarolasse;
batesse alguma coisa ao piano;
que pusesse a gaiola perto quando trabalhasse em sua máquina de costura;
que arranjasse para lhe fazer companhia, algum tempo, outro canário cantador;
até mesmo que ligasse o rádio alto durante uma transmissão de jogo de futebol...
mas o canário não cantava.
Um dia a minha amiga estava sozinha em casa, distraída,
e assobiou uma melodia de Beethoven
e o canário começou a cantar alegremente.
Haveria alguma ligação secreta
entre a alma do artista e o pequeno pássaro?
Alguma coisa que eu disse distraído
talvez palavras de algum poeta antigo
foi despertar melodias esquecidas dentro da alma de alguém.
Foi como se a gente soubesse que de repente,
num reino distante, uma princesa muito triste tivesse sorrido.
E isso fizesse bem ao coração do povo...”


Rubem Braga